Wednesday, September 27, 2006

AS NOVAS VELHAS RUAS

Certa vez eu andava pela rua e vi um menino, tinha seus onze ou doze anos de idade, pés no chao e com roupa suja. Ele tinha em seu olhar uma coisa que não sabia muito o que era, um certo ar de alegria, um certo ar de esperança.
Não contente com minha curiosides persistente, cheguei meio sem graça e perguntei:
"Onde voce mora menino?"
"Moro por aqui, perto dalí"
"E o que faz aqui nesse frio?"
"Moro aqui, minha casa é gelada, mas me esquento nestas grades do chao, as vezes solta uma ventania que serve de coberta"
" E se chove?"
" Aí me complico, tenho de ir pra lí"
"Mas se chove aqui, chove alí tambem"
"Mas alí tem cobertura, passa onibus e joga agua, mas se eu for esperto me esquivo e saio seco"
"Hum, esperto logo ví que você é, mas quando come?"
"Como o que não querem mais, se a gula despreza meio pão, minha fome agradece...vezes outra um senhor gordo me paga almoço, mas se vem segunda, terça me viro nas esquinas."
"Trabalha nas esquinas, faz o que?"
"Limpo carros, vendo doce, apesar que anda ruim esses dias"
" E escola, sabe ler?"
" Sei não, mas sei contar."
"Me da pena, vendo voce me sinto mal"
" Ora! Que papo de mentira, olha pra mim porque entao se ninguem olha?"
"Sei lá, voce passou pelas minhas vistas"
" Bem sei disso, ontem mesmo te pedi trocado e quase que me passou por cima, pressa mata seu coitado"
"Coitado? Que coisa é essa? Estranho vindo de voce!"
"Eu sou assim, mas sou novo e tenho forças, mas voce ja passa da idade, e como vejo que sempre passa por aqui sosinho, dia a dia, tenho dito...coitado sim"
"E voce não esta sosinho??"
" Estar sosinho é uma coisa, ser sosinho é outra"
" Que lorota é essa de voce não estudar, como fala coisa dessas e nem mesmo sabe ler"
"leio com os ouvidos, e escuto muitas coisas, quem não pode voar, ao menos tem de andar com equilibrio"
"Mas que diabos!! Quantos anos tem"
"Quantos anos me dá"
"Sei lá, onze pra doze"
" Que seja isso, não sem quando nasci, só sei o que minha mãe me disse, que quando nasci, nasci pra ser livre"
" E sua mãe onde esta?"
"Tá com Deus, Deus quis ter mãe tambem, e entendi, tinha de ser a melhor mãe do mundo, e que outra mão seria entao?"
"E seu pai?"
"Ah, meu pai sei não senhor!"
"Toma aqui um trocado, pra comida viu moleque!"
"Obrigado, mas pra que seria entao?"
"Ah bem vejo por aqui alguns cheirando cola"
"Isso é verdade, mas se fosse eu aí sim estaria sosinho"
"Olha aqui, me vejo espantado, suas palavras sao estranhas pra alguem como voce!"
"Como sabe disso se nunca falou comigo antes, alguem como eu pode dizer coisas que alguem como voce não posso ouvir"
"Tude bem, meu relogio me lembrou, pego de conversa e minha hora se passou"
"Vai com Deus"
"Voce tambem, naõ fica sosinho por aí"
" Eu Tô naõ senhor, você que tá"

No outro dia no mesmo horario, passei pela rua e ele não estava mais lá, no chão, nas grades do metrô um cobertor velho e um bilhete..." A quem interessar, fui ver minha mãe, não aquentei saudades...."

"Anjos aparecem vestidos de carde e osso, sem asas e com roupas velhas, eles indicam o caminho e se nossa cegueira permitir, vemos uma nova rua onde essa mesma rua nos pareceu um dia tão velha"
Ser nomal é alguma coisa que nunca fui, não sei o que é dormir na hora certa, ou acordar antes do sol nascer, porém o que é normal? Usar jeans com tenis, trabalhar a semana toda e ir ao cinema nos sabados, pipocas com dvd aos domingos?
Rótulos e mais rótulos, somos como mercadorias com nossos codigos de barra, em uma imensa prateleira desse mercado que se chama mundo, estou cansado disso. Essa rotina cruel nos martela sem misericordia dizendo.."acorde, respire, ande, fale, durma!
Mas se não sou normal, o que sou então? O que é o oposto da normalidade?
Ser polemico talvez não seja normal, vestir-se fora das regras talvez não seja normal, mas se hoje em dia todos são polemicos e todos seguem suas proprias regras, caimos de novo na rotina!
Estamos em um beco sem saida, sem portas ou janelas, sem perigo de fuga para os que nos prendem, nós mesmos. Paramos de pensar, muito menos perguntamos o porque, simplesmente seguimos as correntezas, todos os dias...regras e regras, baixamos a cabeça e não duvidamos de ordens que nos são dadas, pule no poço..."sim senhor".
Será que existe um meio termo, ou um meio de quebrar-mos as as correntes que aos poucos nos prendem, dia a dia?
Não sei, só sei que caminhamos para um lugar onde não passaremos de simples robôs, programados para não pensar, ou simplesmente sem a capacidade de perguntar uma só palavra..."porque?"